Dizem que Jim Morrison morreu, mas tenho certeza que ele permanece vivo em cada gole de Johnny Walker que eu tomo. Pegue um copo e tenha boas lembranças.
By Alberton
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Relato Show The Doors em Porto Alegre, 2008.
12.04.2008
Uma mistura de ansiedade e loucura. Este era o ritmo de uma tarde chuvosa neste último sábado. Seria uma provocação dos Riders on the Storm ? Afinal, as leves gotas cintilantes de água que caiam do céu cinza de uma Porto Alegre do ano de 2008 pareciam moldar o ambiente de forma perfeita, embora com uma cara bem diferente de uma Los Angeles do ano de 1967. Mas este era o cenário: o show vai começar.
O local nada mais é do que um pavilhão fabril reformado. E bonito. Entradas grandes, muitos banheiros disponíveis, tudo muito escuro, meia-luz, com grandes bares na lateral direita e nos fundos. Para mim, tudo novidade. Falaram-me de longas filas nos bares, não vi este problema. Tudo correu muito naturalmente. Ainda na rua, uma multidão de jovens e velhos se mistura. Um profundo gole de black label começa a embalar os sentimentos perceptivos.
O palco era tão somente preto. Sem fundo e sem cores. Totalmente preto. O teclado posto de lado já mostrava indícios que Manzarek iria comandar a festa e o palco. Mas também queria se deixar livre para o público lhe observar. A luz forte vinda de cima do palco, reluzindo com o contraste branco-preto das teclas do instrumento, sinalizava que jogo de luzes poderia ser algo diferente. E foi. O jogo de luzes foi fundamental durante todo o show.
A bateria era composta de detalhes mais atuais, com muitos pratos. Pareceu-me a única coisa “diferente” de antes. Bem alta, acima do nível da banda, fugia um pouco do estilo sessentista de tocar o instrumento, onde era apenas uma caixa, um tom, um prato de ataque e uma condução. Mas tudo bem, as demais partes da bateria sempre são bem vindas, pelo menos para mim.
De resto, preto. E luzes, muitas. São 22h em ponto e Carima Burana anuncia o real começo da festa. O som era alto e estridente. Carmina Burana chama a atenção de qualquer um. Quem ainda não havia entrado teve que correr para não perder o início. Estamos no meio do pavilhão, mais à direita, perto do bar. Muita gente. Lotado, mas tranqüilo. Estava como tinha que estar. A empolgação de todos era visível: metade loucura, metade consternação.
Vou contar o que me lembro. Confesso que não há como decorar todo o set diante de um cenário desses. O show abre com Love Two Times, bem rock, segue com Break on Through (com introdução de samba e Dead Cats, Dead Rats) e continua com Strange Days. Neste momento, eu já tinha a certeza de que seria um show com uma interação muito forte. Todos cantavam e pulavam intensamente.
O virtuose começa com When The Music´s Over, solos e solos, improvisos alucinantes da guitarra de Krieger. Este parecia um pouco tímido, mais retraído, concentrado, bem diferente do Ray, que comandava a festa, o público e o vocalista. Era o homem que cuidava de tudo em cima do palco. Waiting for the Sun foi uma surpresa inesperada do set. Coro para “waiting... waiting... waiting...” Sensacional.
Passada a euforia inicial, vem The Soft Parade. Outra supresa, porém esperada, no set divulgado anteriormente ao show. Peace Frog e Blue Sunday continuam a levada do show. Estes lados B sempre são bem vindos em qualquer show. Blue Sunday, de alguma forma, ajudou a substituir a falta que The End fez. Mas sem maiores comparações. Alabama Song fecha esta parte mais light da noite memorável.
Escutar Gloria é uma epopéia, com direito a coro do público no refrão. Uma das músicas prediletas de Jim, com certeza. É o cover da noite. Tudo continua com Spanish Caravan, que é sem dúvida uma música estranha. É ela com quem os The Doors emendam o show, com abertura de um Krieger sozinho no palco, dedilhando um violão em “formato espanhol”. Ray se junta à ele depois para cantar No me moleste Mosquito, antes de iniciar a marcha espanhola. Espetáculo.
O fim do show começa a se anunciar. Aos gritos de Sex Machine, Touch Me entra de sola na cabeça de todos. Euforia coletiva. O início da música, com parada da banda, é cantado por todos os presentes. E não presentes. A música corre na velocidade da platéia, muito mais rápida que o original. Ainda havia tempo para L.A. Woman, minha preferida, que entra rasgando depois de um improviso muito distorcido. Os The Doors invocam Mr. Mojo Risen e a música sai perfeita, com solos dissonantes.
Pelo que me lembro, o show acabou aqui. Claro, bis, sempre. Primeiro veio Riders, que achei que não iriam tocar. Mas os trovões ecoando por todo o pavilhão davam os sinais de que esta não iria passar. O segundo bis é com Light My Fire. Ray chuta o banco, bota o pé em cima do teclado. Um show de vitalidade. Nesta hora todo mundo já estava extasiado e satisfeito. Cada bis, durou, pelos menos, uns 15 minutos. Era muito solo e improviso. Um transe geral.
A banda toda se comportou muito bem. Senti o Krieger um pouco pra baixo, mas deve ter sido impressão. Em alguns momentos ele se soltou mais. Talvez estivesse irritado com o som, que realmente não é bom. Ray era seu oposto: uma alegria só por estar em cima do palco. Comandou a tropa em todo o momento, fazia backings, iniciava as músicas, levantava os braços, conversava com o público. De tudo um pouco.
O vocalista foi um show a parte. Eu tinha receio de como ele iria se comportar, mas a atmosfera conspirou a favor. Além disso, é competente. Ele aparece, pula e canta bem. Sim, ele imita o Jim, mas do seu jeito. Foi tudo bem. Ele se destaca, mas também sabe se colocar no palco de modo que não ultrapasse os limites necessários de Ray e Krieger. Em todas às vezes de solos e improvisos, se posicionava ao lado da bateria com sua meia lua, fazendo parceria com o baterista. Assim ficou bem. Nas horas de voz, movimenta-se com boa freqüência, interagindo bem com todos. Os demais músicos são bem competentes, uma boa cozinha de baixo e bateria. Suportaram bem os agudos de Krieger.
De ressalva, não tocaram Roadhouse Blues, nem The End, ambas reclamadas por muitos na saída do show. Mas vamos fazer diferente: quem sabe lembrar do que tocaram. As cadeiras cheias são mais importantes do que as vazias. Se enumerássemos todas que faltaram, já daria um outro show. Além disso, tocar The End poderia ser muito perigoso. Minha preferida da noite: Break on Through.
O domingo foi de recolhimento e alegria, em família.
Pelo que me consta, eu nasci na década de 70.
Mas hoje eu já posso dizer que vivi pelo menos duas horas do ano de 1967.
By Alberton
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